O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) permitiu que uma trabalhadora de 38 anos saque o saldo do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) para custear seu tratamento de fertilização in vitro. A decisão considerou que os recursos do fundo podem ser destinados ao tratamento de condições não incluídas na lista oficial de doenças graves.
A trabalhadora comprovou sofrer de infertilidade primária, que é a dificuldade de engravidar pela primeira vez, e baixa reserva ovariana, marcada pela quantidade de óvulos abaixo da média. Na avaliação do tribunal, a autorização do saque garante direitos fundamentais, como dignidade humana, saúde e vida.
Elton Fernandes, advogado responsável pelo caso, explicou que há uma tendência na jurisprudência brasileira de liberar o FGTS para doenças graves que não constam na lista oficial. “Nesse caso, a cliente teve um problema de saúde que a impediu de engravidar de formas naturais. Isso não quer dizer que a trabalhadora vai ter direito ao benefício apenas comprovando a dificuldade de engravidar”, destacou. Ele acrescentou que é indispensável apresentar relatório médico que comprove a necessidade do tratamento, o que não se aplicaria, por exemplo, a casais homoafetivos que optem pela fertilização in vitro por motivos pessoais.
A Caixa Econômica Federal recorreu da decisão, sustentando que a situação da trabalhadora não está prevista na legislação. O banco argumentou que a concessão abriria precedentes para “inúmeros outros casos similares” pleitearem o saque do FGTS. No entanto, o pedido foi negado. Procurada, a Caixa informou que não comenta ações judiciais em andamento.
Segundo Flávio Batista, professor de direito trabalhista da USP, o FGTS foi instituído em 1966, limitando os saques a demissões sem justa causa e financiamentos habitacionais. Apenas em 1994, a política começou a se expandir, permitindo o uso do fundo para casos de câncer. A partir dos anos 2000, novas possibilidades foram incorporadas, incluindo o tratamento de HIV, doenças terminais, calamidades públicas e, mais recentemente, questões relacionadas à idade avançada. “Quando as pessoas se viam em situações complicadas na vida pessoal, procuravam a Justiça para sacar um dinheiro que já é delas. Então, a jurisprudência foi construindo um entendimento de que as situações que a lei estabelece são exemplos, e não estritamente definidas”, afirmou o especialista.