O processo de doação e transplante de órgãos inicia com o diagnóstico da morte encefálica do paciente, seguido pela entrevista com os familiares realizada pelos profissionais do Sistema Estadual de Transplantes (SET/PR). No Paraná, esse procedimento tem mostrado resultados expressivos, com o Estado alcançando, pelo segundo ano seguido, a menor taxa de recusa familiar para doação de órgãos no Brasil, registrando apenas 28%, contra a média nacional de 46%.
De acordo com o secretário de Estado da Saúde, Beto Preto, esse desempenho é resultado de um “processo bem estruturado, com políticas públicas eficientes, treinamento especializado e, acima de tudo, o espírito solidário da população paranaense, que continua a transformar vidas por meio da doação de órgãos”. A abordagem cuidadosa e esclarecedora dos profissionais do SET/PR contribui para que as famílias se sintam seguras na tomada de decisão em um momento tão sensível.
O Paraná também lidera o número de doadores por milhão de população (pmp), com 42,3 doadores em 2024, mais que o dobro da média nacional, de 19,2 pmp. No que diz respeito à efetivação dos transplantes, o Estado também ocupa a liderança no País, com 36 transplantes por milhão de população, superando a média brasileira de 17,5 pmp. Em números absolutos, o Paraná registrou 500 doadores efetivos, proporcionando 903 transplantes de órgãos e 1.248 transplantes de córneas. O Estado também se destaca com 76,4 transplantes realizados por milhão de população, ficando atrás apenas do Distrito Federal no ranking nacional.
O processo de doação de órgãos no Paraná segue protocolos rigorosos. Após o diagnóstico de morte encefálica e a autorização da família, a Central Estadual de Transplantes é notificada e realiza o cruzamento de dados em um sistema nacional, verificando a compatibilidade entre os órgãos doados e os pacientes na fila de espera. Quando não há compatibilidade dentro do Estado, os órgãos podem ser destinados a pacientes de outras regiões. Em 2023, 150 órgãos de doadores do Paraná foram transplantados em receptores de outros estados, demonstrando a importância do sistema integrado no Brasil.
Marcela Battilani, psicóloga da OPO de Maringá, atua há oito anos no processo de doação de órgãos no Paraná. Além de acompanhar as famílias, ela também treina equipes para garantir um protocolo altamente qualificado. Segundo Marcela, a comunicação do diagnóstico de morte encefálica é uma etapa delicada e crucial. “A maioria dos pacientes que têm a suspeita de morte encefálica não evoluíram de um quadro de adoecimento, mas sim foram acometidos por eventos súbitos, como acidentes, AVC, disparos de arma de fogo, quedas ou afogamentos. Essas famílias estão extremamente fragilizadas e, por isso, têm medo e receios”, explica.
Ela ressalta que muitas famílias possuem dificuldade em compreender o conceito de morte encefálica, já que, nesses casos, o coração continua a bater e há movimentos respiratórios devido à ventilação mecânica. “Normalmente, a ideia de morte está ligada ao coração parar de bater e à ausência de respiração, mas, nesses casos, embora o cérebro não tenha mais atividade, o corpo do paciente ainda apresenta batimentos cardíacos e movimento respiratório. As famílias precisam assimilar tudo isso e confiar no trabalho das equipes”, completa.
Para que esse processo seja conduzido com respeito e segurança, o preparo dos profissionais envolvidos é essencial. Marcela ressalta que “os profissionais precisam ser preparados para esclarecer dúvidas, promover o acesso à informação e garantir um atendimento digno e respeitoso, construindo uma relação de confiança com as famílias”.
Além do impacto positivo na vida dos receptores, a doação de órgãos também transforma o enfrentamento do luto das famílias doadoras. “Eu realmente acredito que a doação pode ser boa para essas famílias e que pela doação elas podem ressignificar a partida do seu ente querido. Isso para a gente é muito evidente como essas famílias se despedem agradecidas pelo carinho e cuidado que elas tiveram no momento de profunda dor e o quanto isso é importante para que elas possam seguir num luto que traga um significado diferente neste momento de dor”, conclui Marcela.