O programa Direto ao Assunto da semana passada abordou o tema Autistas: direitos que a sociedade precisa conhecer, com a presença das advogadas Dra. Sílvia Cristina Diavão de Mello Favetti e Dra Natália Luiza Giongo, que explicaram de forma simples alguns importantes direitos que pessoas diagnosticadas com TEA têm, como a redução da jornada de trabalho, auxílios financeiros e a isenção de determinados impostos.
Conforme Dra Sílvia, um dos fatores que gera preconceito em relação ao Autismo é a desinformação das pessoas em relação à deficiência que, cada vez mais, está tendo laudos e diagnósticos positivos. “Nesse sentido que é a nossa intenção aqui de ter aceitado o convite, justamente para disseminar a informação no intuito de agregar conteúdo para as pessoas, para que possam cada vez mais abraçar a causa, que está aparecendo com diagnósticos rotineiros aí para nós”, comentou. Para Dra. Natália, a oportunidade para simplificar o “juridiquez” é importante para aproximar as pessoas do tema. “Tentar trazer de uma forma mais clara para as pessoas e demonstrar que muitas delas têm os direitos que podem ser acessados”, complementou.
O Autismo ou Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) – é uma condição de saúde caracterizada por déficit na comunicação social (socialização e comunicação verbal e não verbal) e comportamento (interesse restrito ou hiperfoco e movimentos repetitivos). Não há só um, mas muitos subtipos do transtorno e, por ser tão abrangente, se usa o termo “espectro”, sendo que há desde pessoas com outros transtornos, doenças e outras condições associadas (comorbidades ou coocorrências), como deficiência intelectual e epilepsia, até pessoas independentes, com vida comum, algumas nem sabem que são autistas, pois jamais tiveram diagnóstico.
O Estado do Paraná é o precursor na criação de legislação específica para tratar o TEA. O governador Ratinho Júnior sancionou a Lei Estadual nº 21.964/2024, que é o Código Estadual da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, em 8 de maio de 2024. A lei aborda temas como: Política de educação; Saúde; Mercado de trabalho; Segurança pública; Combate à discriminação; Financiamento de projetos; Inclusão da comunidade autista em espaços de decisão; entre outros. “Nós temos uma legislação estadual específica com todo o regramento quanto às pessoas que têm o Transtorno de Espectro Autista, e isso foi modelo para o Brasil, que também votou agora em setembro, tanto no Senado quanto na Câmara de Deputados, a aprovação desse código a título nacional”, destacou Dra. Sílvia. De acordo com Dra. Natália, uma das inovações dessa lei foi o estímulo à contratação de pessoas com autismo. “Nessa lei está previsto que as empresas que tenham acima de 50 funcionários, 2%, no caso, devem ser autistas. Então, abre também as portas para o mercado de trabalho e a empresa tem incentivo também”, disse a advogada. A lei também garante o direito à Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea) e a instituição do porta-documentos do condutor de veículos automotores autista.
A luta pelos direitos dos autistas no Brasil começou, pode-se dizer, com a ativista paranaense Berenice Piana, mãe de autista e coautora da Lei nº 12.764/2012, que tem como principal objetivo estabelecer a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, garantindo direitos essenciais e promovendo a inclusão social. “Graças a ela, hoje nós temos uma lei que foi aprovada em 2012 que trouxe e equiparou os autistas a pessoas com deficiência e trouxe um olhar da sociedade, da legislação, para as pessoas com autismo”, pontuou Dra Sílvia. Em Palmas, a UAPAR (União dos Autistas de Palmas e Região), é referência no atendimento e acompanhamento de pessoas diagnosticadas com TEA, com psicopedagoga, fisioterapeuta entre outros profissionais envolvidos direta e indiretamente. “A nível municipal, nós temos um trabalho muito bonito e especial desempenhado pela UAPAR junto com o Thompson Schneider, com o Leovildo Mordoschi, na equoterapia com a Anaíra Federizi também, que desenvolve um trabalho excepcional”, reconheceu a advogada.
Níveis
Em 2007, a ONU declarou todo 2 de abril como o Dia Mundial de Conscientização do Autismo. A Organização Mundial da Saúde considera a estimativa de que aproximadamente 1% da população mundial esteja dentro do espectro do autismo, a maioria sem diagnóstico ainda. Segundo o site canalautismo.com.br, no Brasil existe apenas um estudo-piloto de prevalência de TEA até hoje, de 2011, que aponta que há 1 autista para cada 367 habitantes (ou 27,2 por 10.000). Segundo a estimativa da OMS, o Brasil pode ter mais de 2 milhões de autistas.
O autismo é classificado em três níveis de gravidade, de acordo com a necessidade de apoio e a autonomia da pessoa: Nível 1, também conhecido como autismo leve, quando a pessoa precisa de pouco suporte; Nível 2, também conhecido como autismo moderado, quando a pessoa precisa de um suporte razoável; e Nível 3, também conhecido como autismo severo, quando a pessoa precisa de muito suporte. O diagnóstico é feito por profissional médico, de acordo com a necessidade de suporte de cada indivíduo. “Esses níveis são usados apenas para fins terapêuticos e a lei prevê que todos os autistas, independentemente do nível, devem receber as mesmas garantias, os mesmos direitos”, ressaltou Dra. Natália.
Direitos
Ao se falar sobre os direitos das pessoas com TEA, alguns merecem destaque, como: acesso a diagnóstico precoce, tratamento, terapias e medicamentos pelo SUS; meia-entrada em estabelecimentos de lazer, como cinemas, teatros, parques, museus e estádios; acesso gratuito ao transporte coletivo interestadual (solicitado pelo portal do Ministério da Infraestrutura); o acompanhante de uma pessoa com TEA pode ter um desconto de 80% na passagem aérea; Benefício de Prestação Continuada (BPC) da Lei Orgânica da Assistência Social (Loas); vagas de emprego (Lei 14.992/24); saque do FGTS; aposentadoria; desconto na aquisição de veículos; isenção de impostos; carteirinha de identificação para garantia de atendimento prioritário; entre outros.
“Todas as pessoas com deficiência têm a possibilidade de requisitar o saque do FGTS, por exemplo, mas, muitas vezes, o que acontece? Esse formulário, preenchido na Caixa Econômica, vem escrito “autismo nível 3”, e essa é mais uma inconstitucionalidade que nós temos no âmbito administrativo. Legalmente falando, nós não temos essa discriminação entre os níveis. Portador de autismo é pessoa com deficiência. Então, independentemente do nível, e isso é questionado judicialmente. Claro, muito mais tempo, muito mais moroso, mas até criar essa ideia para a sociedade, é superimportante que isso movimente realmente o judiciário para que isso pare de acontecer no âmbito administrativo”, observou Dra Sílvia. “Nós precisamos não só disso, mas de representatividade também, que é extremamente importante para que esses direitos sejam, de fato, reconhecidos para abranger a nível nacional, ara as coisas andarem mais rápido”, complementou Dra Natália.
Persistência
As defensoras dos direitos dos autistas frisam a importância de os portadores de TEA e suas famílias não desistirem diante de obstáculos sociais, jurídicos ou administrativos, mas, sim, permanecerem firmes na luta pela garantia do reconhecimentos de seus direitos. “Às vezes faz o pedido administrativo, recebe uma negativa, a pessoa para por ali, e deixa de receber outros direitos. Então, vá sempre atrás dos seus direitos, até porque a gente está falando muito desse negócio de abraçar a causa. Precisa fazer valer os direitos, para a pessoa não desistir e realmente ir em busca dessa concessão, desse benefício”, apontou Dra. Natália.
Em todo caso, a luta por direitos é contínua e para que sejam verdadeiramente efetivados requer o envolvimento não apenas dos interessados, mas de toda a sociedade que, unida, pode fazer a diferença para a implementação de políticas pública e equidade.